por Ana Chiara
(Iracema Revisitada, últimos capítulos)
Capítulo XXV
Martim,
olhos saciados, enjôo.
Quem ceou, ceifou,
partiu.
Na lagoa, debalde,
sapo canta seu canto.
A morena ,
nem tão virgem,
nem tão morena,
arrasta um monte
sua mágoa,
inda cá,
cantava no peito
o sabiá.
Capítulo XXVI
Mecejana :
desinência ana
(ação de fazer)
lugar do abandono.
Jandaia aos gritos:
nem pátria, nem amor.
Desventurosa.
Desatino, vida a dois.
Dali não passa,
goiamum sai de fasto.
Flor de maracujá
-no peito guarda-
toma banho na saudade.
Capítulo XXVIII
Interlúdio
fere espinho pixuna
ciúme na garganta.
Ele, lábio seco para o amor,
beijo morno e áspero.
Ela , sem alegria,
Sentença de morte, profecia,
Abati, árvore sombria.
Capítulo XXIX
Dilata-se a ausência.
Ela morde o pó da tristeza,
seta cravada no chão.
Ele combate inimigos, invisíveis.
Cavaleiro da triste figura
canto guerreiro
no festim da vitória,
ela, no canto.
Enquanto, encanto!
Nos campos da Porangaba:
bebê sem pai,
sem pátrio poder,
a pátria nasce.
Capítulo XXX
A indígena pare um Brasil
Filho da dor, vampiro d´alma.
Mãe gentil, viúva solitária,
pai e mãe, chefe de família,
cabeça, tronco e mamas,
tetas gordas de leite e mel,
golfadas azedas do filho na cara,
há três sóis caminha.
Morta para o pai, filha sem mãe,
A morena, a mísera esposa,
lábios suspirosos,
não despede a lembrança,
aferrada à fantasia,
presa ainda
na porcaria.
Gritos da jandaia, choro infantil,
Serve peitos aos cachorrinhos,
leite escasso, sangue fraco,
esguicha, poreja, alimenta
com fracas esperanças
toda a nação.
Descamba o sol.
Capítulo final reescrito:
Iracema descola,
abre asas, decola
-flor do campo, linda flor-
topless, volta do banho,
brilham gotas,
beijos do sol.
Emudecida nos lábios
amor é apenas palavra decolando
(descolando)
com as jandaias para o anil.
Iracema, heroína século XXI,
no metrô, olha pra frente, canta um rap:
tudo passa sobre a face da terra, me’rmão...
fila anda,
passa um fax,
um fiat lux!
1º de setembro de 2010
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